Sou um português desempregado da tv portuguesa desde que tive a ideia como estagiário de prolongar em direto as imagens do apedrejamento aos polícias e que tramaram o nuno santos da RTP. Ao contrário dele que ficou cá para ser ouvido pela ERC eu decidi aproveitar a oportunidade, há quem diga que é expulsão, que o meu país em crise me deu, por sugestão do vosso (já aí não estou) primeiro-ministro e do também “vosso” presidente da comissão europeia. Agora trabalho aqui para uma estação da tv americana que faz parte de um grupo de canais e programas, a OWN (pelas iniciais já se vê - a outra é de Network) propriedade e principal acionista da maior entrevistadora do mundo, a Oprah Winfrey, uma espécie de judite de sousa à americana, ou melhor a felícia cabrita do crime de investigação. Disponho de dinheiro a rodos para fazer subir as audiências – contrataram-me logo ao verem a nacionalidade no currículo, e porque constava lá que trabalhara num banco, o que é verdade pois sempre gostei da carpintaria como atividade lúdica.
Vou começar neste meu novo emprego na próxima quinta-feira, dia 17, às 9 da noite (serão 2 da manhã para vocês ai) com um assassino em série que dizem, andou a matar o ciclismo, creio que a golpes de pedal, durante anos, sobretudo nos meses de julho, quando ia de férias para a europa, principalmente para frança, e que vai confessar todos os seus crimes e de como os praticou e ensinou a fazê-lo aos que o rodeavam. As audiências vão rebentar pelas costuras e os publicitários vão engalfinhar-se para meter lá os seus anúncios durante a confissão. O dinheiro tem a bondade de comprar a verdade que queremos ouvir. Embora não seja bem comprar, é mais extorquir.
O meu próximo trabalho é levar lá um dos padres aqui destas paroquias americanas, daqueles que seguem à letra a passagem da bíblia “deixai vir a mim as criancinhas”, mas acho que isso é demais para as mentes religiosas destes americanos. Pensando melhor, que graça tem um padre a confessar-se. Tenho a certeza que o vaticano lhe daria o dobro do dinheiro que eu lhe oferecesse para não o fazer em público, só em privado, mas ao senhor Bispo. Pois se até o papa já pediu desculpa pelas atrocidades cometidas no passado pelas cruzadas aos infiéis, admitindo finalmente os crimes da igreja, e não os na igreja. Só foi pena não lhes ter devolvido as coisas saqueadas, como os alemães nazis tiveram que fazer com o ouro dos judeus enfiado nos bancos suíços.
Se não conseguir o padre, vou-me virar para o Bin laden, já que se o meu antecessor neste cargo conseguiu descobrir um navio titanic(o) que se afundou para aí há 100 anos e deu uma porrada de massa aos patrocinadores com as audiências no cinema e na tv, mais fácil será para mim descobrir um corpo de há menos tempo e em águas menos profundas. Mesmo morto sei que não resistirá ao charme do meu dinheiro para confessar tudo, para gáudio do público, agora que os confessionários se instalaram na tv.
A tv é como a magia, considerada a arte do encanto. O truque do mágico consiste em não ser descoberto. Todos sabemos que aquilo não pode ser, mas gabamos a habilidade deste fabricante de ilusões, as coisas que andou a fazer nos bastidores do palco, ou quando saca da manga uma série de produtos que despistam ou encobrem os anteriores. Há ilusionistas que deixam que nos treinos dos ensaios todos os que o rodeiam assistam à sua preparação. Sabem-no desde sempre os empresários e o stafe, que se calam pois o espetáculo tal como no circo deve continuar. Só por despeito as acompanhantes irão revelar o segredo do truque do ilusionista para não ter que matar a galinha dos ovos de ouro dos empresários, a menos que lhes paguem bem (é aqui que eu entro).
Se algum vem depois confessar como se faz (eu ajudo, já disse), perde-se o encanto e encolhemos os ombros. Qualquer um de nós fica apto nos truques depois de sabermos como se fazem.
Um magico que desfez recentemente o encanto (outro infiel está visto) foi o homem das t(f)acadas. Ora o encanto (no casamento) é não se ser apanhado, mas sendo vale a pena desmentir publicamente? Este rapaz com o taco nas mãos passava todo o ano por esses campo fora a enfiá-lo nos buracos (para retirar as bolas claro) lembram-se, não o fez e assumiu. Aqui para nós, o que é que os puritanos esperavam dum tipo com um nome destes (tiger woods) que traduzido aí para portugal seria, o tigre da mata ou da madeira (do pau digo eu). Daqui a 20 anos se ainda eu tiver verba (e emprego) trago cá o filho do Messi.
O meu trabalho visa as audiências, mas se fosse eu o apresentador começaria este programa com: era uma vez um rapaz a quem todos os colegas de trabalho viraram as costas quando adoeceu, a própria entidade patronal foi ao hospital para que pudesse rescindir o contrato antes que…como se tivesse cancro. E não era que tinha mesmo! Lutou e recuperou, tal como já recuperara dos olhares de recriminação dos amigos, colegas e professores de escola, quando na adolescência o pai o abandonou (ou foi à mãe?). Agora de novo abandonado aos 40 por amigos, marcas e instituições, lá vai ter que lutar para se recuperar socialmente outra vez. Dá para concluir que o homem é mesmo do piorio, porque ao longo da vida todos acabam invariavelmente por o abandonar. Até o cancro já não quer nada com ele.