31 de Agosto de 2010

Quando as crianças brincam aos médicos, estão apenas a copiar os adultos.

In Daniel Sampaio, psicólogo

 

Esperou tranquilamente que a mãe lhe colocasse a fralda, de que fingia precisar, mas que daria jeito nessa manhã. Na cozinha tinha um prato de papa maisena à sua espera. Assim que acabou meteu três bolachas maria no bolso do capuz e correu para o átrio onde tinha o seu "mais que tudo" à espera. Olhou em redor, abriu num ápice o porta moedas da mãe e tirou de lá uma moeda, que trocaria, mais tarde por um bolo de arroz. Enfiou um velho penico de plástico sem asas pela cabeça abaixo e atou o cordel por debaixo do queixo. De seguida meteu as mãos numas meias de lã, que tirou do bolso das calças, gamadas ao irmão mais velho (as meias, não as calças). Finalmente viu-se na rua, onde já o esperam outros miudos, cada um com o seu triciclo, igual ou melhor apetrechado que o dele.

Antes de partirem todos á vez, foi decidido o caminho a tomar. Só havia duas alternativas: dar a volta ao quarteirão ou demorar um pouco mais circundando a escola. Nesse dia, como não estava tanto frio, escolheram a ultima. Dai a pouco iriam encontrar, uma meia dúzia de metros não pavimentado, em terra batida, o que era sempre motivo de desagrado do Correntino, porque as rodas se enchiam de lama ou pó, consoante a altura do ano, alegava.

Este puto tinha coisas esquisitas, por isso os outros nem sempre esperavam por ele durante o caminho, por vezes também lhe batiam e chamava-lhe maricas. Numa dessas vezes servira-se de um deles como testemunha abonatória (já que o tinham abonado) perante a sua mãe, que não tinha a certeza das suas queixas. "Se eles te baterem, bates-lhes também", aconselhou a mãe:

-  Oh mãe, mas eles são tão bonitos!

Nem todos são assim, mas também há aqui meninos muito vaidosos. Um mostra o triciclo novo que o tio lhe deu, outro é o capacete da avó, aqueloutro a roupa combinada tipo manequim, oferta da prima, idem para as rodas, o volante, a fita, os ténis, o bidão do compal, o assento e etc.

Um dos pais até dissera numa ocasião: Para quem é pequeno, isso não é mania das grandezas? Ao menos saberão andar de triciclo?

Com o seu pai também nunca se safava pois respondia-lhe com questões. Dessas, sem resposta, já ele tinha muitas, e varias vezes se perguntara naquele dia que fariam este meninos atrás dos outros mais fortes? Decerto à espera que eles não aumentem muito o ritmo e os façam descolar e depois virão a penar sozinhos um (hor)ror de metros. Não lhe parecia muito divertido. Hoje até chegara à frente de uns quantos, sabendo que lá para trás havia meninos que andam melhor.

Continuava sem perceber porque é que estes meninos não brincavam com outros meninos do seu tamanho e da sua idade, e se conseguir vir na roda, o tempo todo a assapar, era isso triciclismo.

Fechou os olhos e viu-se já adulto lado a lado, ombro a ombro, cabeça contra cabeça, a lutar pela posição por onde o seu colega de sprints haveria de passar e pareceu-llhe ouvir a voz da mãe ao longe.

- Acorda e vai dormir a sesta para o teu quarto. Estás farto de dar cabeçadas na mesa e já ias derrubando o copo de leite.

publicado por Ubicikrista às 17:36

24 de Agosto de 2010

FICÇÃO

 

"O cu é a parte do corpo que mais depressa esquece os maus tratos”.

In O mundo do fim do mundo, Luís Sepúlveda

 

Todos os domingos pela manhã, sempre que não tem provas de competição, é dos primeiros a chegar às garagens. Sonha de véspera com os companheiros/adversários que irá encontrar nesse dia, a quem vai ter que dar uma lição, mas só a alguns. Irá tentar impor um andamento tal que poucos conseguirão ir na roda. Depois de partir o grupo todo, começará com os esticões e as tentativas de fuga. Terá que ter alguma paciência, para que o momento chegue, pois os gajos mais velhos, tem a mania de não despregarem lá da frente nos primeiros quilómetros e só o fazem quando a primeira subida aparece. Às vezes escolhem caminhos sem subidas e demora mais tempo a chegar esse momento por que tanto espera. Só quando mete carga no treino da véspera é que lhe não agrada muito que outros imponham andamentos de loucos. Nesses dias só fala no treino do dia anterior e espera que não haja muitos cabeços.

Estas manhãs de domingo assemelham-se em tudo às corridas em que participa. Mas é mais fácil ganhar aqui. O pessoal nem sempre se organiza a persegui-lo como lhe fazem lá. E também não há prémios, mas a malta fica a saber como ele está a andar bem neste momento. Aliás é esta a razão principal porque cá vem competir como nas corridas.

Um dia destes ficou admirado ao ver o Três Pedais entrar-lhe pela garagem adentro, para lhe pedir de volta uma câmara de ar, que este lhe emprestara á coisa de 15 dias, quando já pensava em telefonar à mulher para o ir buscar, porque nem tivera tempo de avisar os outros do furo, já que seguiam obcecados com a mania das corridas – já era o segundo furo do dia e no primeiro desenrascara-se porque fora logo á partida -, valeu-lhe então os Três Pedais que o safou porque tinha ficado para trás a aliviar a bexiga, durante a paragem no café, e quando chegara cá fora não vira vivalma. O Três Pedais fazia parte daquele grupo de ciclistas que o admirava pela quantidade de troféus e taças que colecionam todos aqueles que ao longo dos anos entram nas provas de competição. Daí o seu silencio quando este, olhando as prateleiras preenchidas com outros apetrechos, que não as taças, o questionou acerca do paradeiro das mesmas. Continuando com a inspeção visual á garagem o Três Pedais insistia na pergunta e como não obtinha resposta ele mesmo a deu.

- És um vaidoso. Mandaste-as limpar não foi, meu vaidoso?

Perante novo silêncio embaraçoso, o Três Pedais, na sua humildade complacente, resumiu:

- Pronto não digas nada. Agora percebo a tua demora na devolução da câmara de ar. Estás sem pilim. E logo tu que andas em tantas corridas, que pena teres que vender todos os troféus. Que porra de crise.

publicado por Ubicikrista às 17:07

19 de Julho de 2010

O ciclismo é um desporto de grupo. Uns puxam outros protegem-se. Estudos revelam que 95% do tempo de uma etapa é passado em pelotão. Só os que querem ganhar e os (a)garrotados é que não aproveitam a oferta. Exceções:

*    Abaixo dos 5º graus
*    Debaixo de uma trovoada
*    Acima dos 38º graus

E explica-se:

Frio e vento lateral não aproveitam a ninguém, assim como ir na roda com lama e água. Finalmente andar na sombra de alguém, com calor, é um mito.

Nestas circunstâncias é cada um por si, seja furo ou corrente. Até porque o gaspacho pode arrefecer.

publicado por Ubicikrista às 01:41

11 de Julho de 2010

CARISMAS

Não contem com ele para pequenos ou grandes andamentos, ignora o ritmo do grupo, é um pouco à Pinto. Quando o grupo vai a recuperar é vê-lo passar e adiantar-se pouco a pouco gradualmente. Quando o grupo acelera é vê-lo ficar. Regula-se provavelmente pelos batimentos. Quando os dois lados acertam a velocidade acontecem coisas como a de hoje:

Com partida ás 8.40, restava-nos 50 minutos para chegar à Caridade para compromissos de índole divulgativos da modalidade. Instalou-se na frente e quando chegámos á ponte do Aldrabão, 26 kms depois, tinham passado 43,30 minutos o que dá, para os estatísticos, uma media de 36 (na verdade só há médias de 33, como já se provou). Acrescente-se um acumulado de 75 m. Nunca ninguém do grupo passou na ponte, antes dos 50 min. E nem se fala do vento lateral.

Mal tomou conta da cabeça do grupo a seguir às três ondas, começou no 17, em pedaleira grande e terminou no fim do carreto sempre em crescendo com um acelerar natural á medida que o relevo pedia, e só por duas vezes voltou atrás.

Factos:

Não houve grandes esticões e quando se deram ninguém respondeu de imediato mas só á vez.

Nem um só elemento se atrasou - mesmo o Pinto que não andava á meses – logo o que conta sempre não é dois ou três conseguirem, mas o grupo todo.

Vídeo a ser editado e atualizado peridicamente

publicado por Ubicikrista às 23:09

O futuro, que ninguém sabe o que é ou viu, às vezes anda atrás dos ciclistas e...ao lado, ao Pedro & herdºs

Há uns anos fomos subir a Serra da Estrela. Ao descer dos carros, para começar a subida, à saida da Covilhã, o Tiró Lenço que é de reguengos, grita horrorizado:

- Não abalem ainda, estou sem travões.

Nas serras estas ferraduras não fazem falta, mas para as cicloturisticas, como a de hoje, sim. Embora 20 minutos antes da partida tenha dado mais jeito a alguns ir em frente sem ter que travar para virar à esquerda (Pigeiro)

Não foi por Caridade, mas sim porque um amigo pediu, que fomos fazer vulto com todo o gosto. Foi assim nos Canaviais, na Graça do Divor e na de Borba, sempre que alguém - Gabriel Mauricio, Joaquim Miguel e agora o Cunha - quer divulgar o Cicloturismo. Gasta-se apenas mais um pouco de calços do que o habitual, em compensação poupa-se nos pedais.

Pensamento do dia: Se o tuga do D. Afonso Henrique não tivesse batido na mãe... habiamos sido campeones del mundo!

publicado por Ubicikrista às 16:26

10 de Julho de 2010

Desde o Agostinho que sabemos que os cães

são os principais inimigos dos ciclistas.

Diálogo entre Cristiano e um Jornalista americano que o perseguia.

CR: Vai andar assim sempre atrás de mim?

J: Sempre!

CR: Assim, um dia podes ser morto por alguém numa rua.

J: E tu um dia vais sofrer uma entrada que te partirão as pernas... até pode ser o Rooney!

CR: (Sorri).

Isto é espirito desportivo, o chamado fair-play, em que um pelotão aceita integrar fácimente uma besta qualquer, mas não impede decisões do publico em afastar ciclistas. Já uma organização pode fazê-lo, com a expulsão até, quando vê ciclistas profissionais praticando outras modalidades. Desta vez já não estando em competiçao a sanção foi distinta... 150 €, mas não deixa de ser um crime tentar partir, com o capacete, uma roda Bora que custa para cima de 1200€ cada.

 

NOTA: Fica provado que o ciclismo é um desporto de contacto, não de full contact. Ao contrario dos não profissionais que guardam as ultimas forças, no fim de uma etapa, para se sentarem no chão ou deitarem-se na relva

publicado por Ubicikrista às 03:36

05 de Julho de 2010

FICÇÃO

Dos vários tipos de vingança, a do Chinês é a mais conhecida,

mas nada se compara à da mulher dos tremoços, In I

 

Os ciclistas parecem odiar o sexo, já que passam grande parte do tempo em cima dele, esmagando-o contra o selim. Mas a sério, o sexo do cilcista é assunto tabu e tão confidencial que ninguem se expõe. A exceção foi o Porta Bombas que disse uma vez não perceber a mulher de à uns anos para cá, quando entrou na menopausa. Com um curriculo tão vasto em doenças, nos momentos cruciais das batalhas corporais, não sabia se ela gemia de prazer ou das dores nas costas. Mas se não falam deles com as mulheres, falo eu de mim, pois seguramente também já vos aconteceu o mesmo.

Um gajo chega a casa e quer recompensá-las das ausências dos treinos. Mete a porcaria do Tony Carreira a tocar, e tal como dizem os CTT em relação ao código postal, é meio caminho andado. Uns amassos depois, como canta a Calcanhoto, e o melhor amigo do homem - não, não é o cão, isso é um mito - levanta-se sem precisar da voz do dono. È nessa altura que surge a desculpa de que a mãe nesse dia - mentira noite - está lá em casa a dormir. Mas não, desta vez não vamos aceitar essa desculpa mitica. Vamos ser mais originais. Retrocedamos então um pouco para  darmos voz á esposa: Oh querido!... agora não tenho vontade. Abraca-me só, pode ser? E diz-me isto com uma descontração na voz que só as mulheres sabem ter - e também já alguns homens. Serão mesmo homens? - ... Eu penso cá para mim: Ké? Ela completa o ramalhete sem ouvir a minha resposta com aquelas palavras femininas mágicas que todas(?) têm na ponta da língua:
- Vocês são todos iguais! Não percebem as necessidades sentimentais de uma mulher.

Porra,  eu nem sequer respondi porque ainda estava a engolir em seco e fora nessa fração de segundos que ela falou. Tá bem pronto, como dizia o meu pai,  “coisa” adiada é coisa perdida. Por mim conformo-me, mas á que tratar do melhor amigo do homem - ainda haverá por aí teimosos que insistam no cão? -  e uns minutos debaixo do chuveiro de agua fria, normaliza a situação.

publicado por Ubicikrista às 23:12

06 de Fevereiro de 2010

FICÇÃO

Sugiro veementemente a Vossa Excelência que procure receber contribuições inusitadas

no orifício cocorado, do qual é proprietário, sito na região sacro-ilíaca

- do meu amigo Vasco, se alguma vez se zangar

 

A determinação com que um ciclista isolado pedala para a meta, por vezes já todo roto, é coisa que nos espanta sempre. Mas, e a determinação das mulheres? E se essas mulheres forem as esposas dos ciclistas? Vejamos. Voluntarina é uma esposa tão determinada que raramente dá o braço a torcer, pelo contrário. A sua determinação ficou bem patente enquanto ela esperava pela fisga da persiana da janela da sala, que o marido chegasse de mais um Évora-Caparica, quando lhe pareceu ver um vulto no quintal. Aproximou-se por detrás e sem fazer barulho, deitou-lhe a mão às partes baixas enquanto perguntava: quem é você. Não tendo obtido resposta, determinada, apertou com mais força e insistiu: quem é você. Nada. Já com pedaços de pele entre as unhas dos dedos, fez um ultimato. Finalmente o vulto explicou-se:

- Sou o mudo!

Voluntarina não é assim com todos. Com o seu marido, a quem os amigos chamam Pedal de Prata, para ela o seu PêPê, apenas lhe ralha por este ser teimoso em não querer admitir que é por ele que se atrasam sempre durante a semana para o emprego, mas que para andar de bicicleta todos os domingos e feriados até se levanta meia hora antes. Ele não concorda e acha que é é determinado, afinal ele é apenas um homem adaptado aos tempos modernos e à correria da vida, e para o provar levanta-se sempre com determinação cinco minutos antes de saírem de casa. Desfaz a barba com a máquina numa mão enquanto come uma maçã com a outra, a seguir escova os dentes enquanto com a outra mão faz o xixi matinal. Por vezes já tem feito amor com a mulher enquanto penteia a sua farta calvície.

Voluntarina, como qualquer mulher ou esposa, parece ter mais tempo para pensar, e num desses domingos em que Pedal de Prata, depois de 4 horas a pedalar até Monsaraz, quando se preparava para o duche retemperador, reparou num letreiro por cima da sanita a lembrar-lhe que ali se deve urinar sentado. Foi com um grito de horror da esposa que, 2 minutos depois, quando esta ia buscar a camisola interior suada, as meias e os calções (cuecas não, que não é material que ciclista use), para meter tudo na máquina de lavar, deparou com ele, meio sentado, mais para o deitado, no chão da casa de banho, a um metro da sanita e dali a tentar acertar lá dentro, num rigoroso exercício de cumprimento de ordens escritas, que ele não queria desobedecer, pois uma vez já tentara o divórcio indo mesmo a Tribunal. O Juiz até lhe pediu para lhe dizer qual o motivo para se querer divorciar da esposa (da esposa pois – ainda este ano se esperam divórcios de esposos). Meio envergonhado lá respondeu que ela o tratava como se fosse um cão! Mas, insistia o Juiz, maltrata-o, bate-lhe, não lhe dá de comer?
- Não! Quer que eu lhe seja fiel...

publicado por Ubicikrista às 04:45

14 de Outubro de 2009

Exmo. Senhor,

Por motivos operacionais e aos quais a Fundação INATEL é completamente alheia, informamos V. Exa. que apesar dos inúmeros esforços para a realização do mesmo este será cancelado.

Grato pela sua compreensão,

Com os estimados cumprimentos,

Carlos Borralheira
Director Agência de Évora

 

Do provedor da prova, recebi este mail terça-feiras às 14.18 h.

Deixo os comentários convosco, mas... quem adiou uma e vez, e outra...

 

Obs: Este email e todos os acontecimentos que o precedem, traz-nos á memoria outros factos premonitórios passados, tornando inevitável este desfecho, como se pode Ler aqui nesta crónica ficcionada na altura.

O Administrador do Blogue.

publicado por Ubicikrista às 08:13

02 de Outubro de 2009

 

FICÇÃO

O NOVATO

Ao amigo Cunha de Aldeia Nova, em processo de reconciliação

- Daqui para a frente só médias de 33.

Há 2 meses que andavam a preparar a coisa. Treinos, gradualmente em crescendo, em pequenos grupos à terça e quinta-feira, de 80/90 kms e em conjunto, aos domingos de 100 até 130 e tal. Quem quisesse mais, podia mas só “em pedaleirinha” á quarta e ou à sexta.

A maioria vai e nem questiona, pois confia em quem decide. Principalmente aqueles acabadinhos de chegar, os chamados casadinhos de fresco, a este mundo das bicicletas. São uns cromos que querem ouvir tudo, não descolam. Querem saber dos andamentos leves, dos andamentos pesados, das rodas, do peso, da alimentação, das barritas encarnadas com sabor a pneu, dos crankes 172 e meio, dos compactes, dos rotores, dos novos Sram de 12 mudanças, dos carretos de 10 dentes, das pedaleiras ovalizadas … Ufa. Querem! Mas a única coisa que percebem verdadeiramente por enquanto é tão só os dias a que se anda e os kms a fazer.

O Volantino Inteiriço é um deles. Tem tanta vontade de aprender tudo que estranhou na última semana antes do Évorabike, ninguém falar em treinos. Abeirou-se á sucapa do velho chefe de fila, e em surdina  individualizando a coisa, aventurou-se:

- Não acredito que não treines antes de domingo.

Ora se estávamos a acabar o treino de quinta-feira, numa altura em que cada um vai para a sua casa e já descêramos da pedaleira grande, com as gambias em descompressão, pois este era o 3º treino que enfiáramos no bucho nessa semana, o que é que ele quereria? O mais velho do grupo já passara a mensagem de não se esquecerem de fazerem 2 ou 3 refeições de massa ou arroz, para acumular hidratos que dariam jeito dos 50 km para a frente.

Voltou à carga, insistindo na dele:

- Não me enganas. Não acredito que não faças mais nenhum treino até domingo.

Perante tanta insistência, em voz alta, para todos ouvirem, o atingido puxou dos galões e num assomo de liderança ofendida, rapidamente sprintou num fingimento meio zangado:

- O resto da semana é só médias de 33.

O novato ainda esboçou um ar de desconfiança, mas o velho chefe de fila deu a corrida por finda, acelerando para um final na questão.

- E só em circuito fechado.

Os novatos têm esta mania de nunca estarem satisfeitos. Levam sovas monumentais de kms. Mas como diz o Tiró Lenço, parece que engoliram uma bicicleta e a partir desse momento só ficam satisfeitos com mais e mais. Sejam treinos, conversas, bocas … querem é estar presentes em tudo. Têm medo de que algo fique pelo caminho que não consigam entender, seja um gesto, um olhar, uma indirecta. São piores que os velhos a jogar às cartas sempre á espera que o parceiro lhes dê sinal de bisca.

Percebe-se. Inteiriço já estivera tempo de mais afastado das lides das bicicletes. Quem é que imaginava que aos 50 anos podia vir a ter tanta importância, tanta atenção, tanto interesse … ele bem via os seus amigos da mesma idade para quem o único desporto conhecido, e convenientemente sentado, é o das damas, no tabuleiro. Mas ele julgava-se mais importante que os velhotes, pois era praticante assíduo de “mapling”. Uma espécie de tiro ao alvo que ele considera desporto e que se pratica a partir de um sofá com um comando na mão, que apontado para a televisão (em tempos tentara na direcção da sogra, a ver se esta lhe trazia uma cerveja fresca, mas sem resultado), pressionando num dos muitos botões nunca falha o alvo. E quando falha, de 6 em 6 meses, a culpa nunca é dele. É do aparelho. Então desculpa-se com as baterias e corre logo a substitui-las, como vê fazer aos treinadores com os jogadores do banco sempre que as coisas não correm bem. A prática diária e continuada desta actividade física originara-lhe uma lesão que por pouco não o levava a abandonar este desporto, estragando-lhe eventualmente uma carreira promissora. Foi durante um jogo do seu clube. Finalmente o golo apareceu. O seu contentamento foi tanto que levantou os braços para a frente a festejar. Quando se tentou sentar novamente, o sofá numa atitude de submissão canina – quiçá também de adepto – tinha avançado também na direcção da televisão. O impacto apanhou a poltrona pelo meio das costas, que pelas contas da lei da gravidade, fez o adepto do “descendente do Visconde” ficar momentaneamente a pairar entre o parapeito da janela a um palmo do chão, a cobiçar-lhe a nuca ou regresso á habitual posição de todos os dias. Podia ter pendido para quaisquer dos lados. Por fim safara-se o sofá, não obstante sentir uma manápula que quase lhe arrancava a pele, enquanto o dono deslizava suavemente até ao chão. Finalmente o comando aterrou, mas esse som foi abafado pelo grito alucinante de Inteiriço ao sentir um músculo a dar de si no braço acabado de posar no sofá. Rescaldo do acidente aéreo: o sofá jurou nunca mais se meter em manias de clubite. O parapeito, irá continuar a ter uma paixão platónica e de paciência alentejana por nucas. O comando, ao fim de anos finalmente sentira-se livre ao voar como um passarinho. Inteiriço durante meses não conseguiu que o músculo ofendido do braço lhe permitisse tocar no comando, para gáudio deste. (continua)

publicado por Ubicikrista às 03:33

FICÇÃO

O NOVATO

(continuação)

Ele bem conta a sua versão dos factos a todos os amigos alertando para os que queiram praticar este desporto perigoso:

- Façam “mapling” mas bloqueiem-lhe as rodas.

A verdade aqui para nós, é que ele, até aquela idade, não praticara nenhum desporto. Atirara até uns pontapés a uma bola em novo a meias com um vizinho gordo, de quem os outros gaiatos fugiam da companhia. Vira ao longos dos anos os colegas de trabalho inscreverem-se em actividades colectivas do Inatel, como o andebol, o basquete, o voleibol e até o atletismo, mas a ele nunca nenhum colega o convidara verdadeiramente, nem mesmo para fiscal de linha, nas jogatanas que antecediam as almoçaradas de Natal. Também porque é que haveriam de o convidar, nunca tivera jeito para desporto nenhum, para além de umas braçadas na quinzena de férias em Quarteira todos os verões. E mesmo esse pseudo-desporto era para tentar impressionar uma solteirona jeitosa que todos os anos na mesma altura, tinha como vizinha naquele toldo alugado por 2 semanas. Ele até reparava que a maioria das vezes, quando voltava do seu acto de bravura, as ditas braçadas, ela estava de olhos fechados enquanto esturricava o “corpo” - porque não sei se notaram é o que algumas donzelas têm – ao sol e nem reparara em tanta bravura, digo braçadura, que acabara de perder. Então durante alguns minutos para completar a faena, fazia-se ao sprint final, andando de um lado para outro, no espaço de 50 metros, junto ao areal, até o efeito do peito inchado desaparecer, mal sabendo que aquela subida peitoral que ele não controlava, mas que ostentava com tanta devoção, e que ano após ano se prolongava por mais tempo, se devia ao facto de, ao armar-se em nadador, mal conseguia respirar, dando origem a que o diafragma se manifestasse pelo brusco comportamento do seu dono naqueles 15 dias, e só naqueles. No resto do ano o diafragma poderia descansar do desporto.

Como desportista inapto como vimos (ou é inato, os Palops que resolvam. Pronto, não lhe digam, fica inepto) fez correr o boato de que era até simpatizante do Sporting para poder ser motivo de chacota dos colegas sempre que este perdia. Mas continuava a ouvir, cada vez com mais atenção para poder intervir nas conversas dos colegas, á espera de uma oportunidade. E não é que esse dia chegou.

Desde já algum tempo que reparara num ou noutro colega, digamos, assim a modos que desportista como ele, que vinham fazendo pequenas afirmações, extra futebol, do tipo:

- Olha este Domingo foram 70.

- Ah! Eu já fiz 40 e ainda me dói o rabo, mas foi só a 2ª vez.

Ao princípio ainda pensara, se algum deles andara na Casa Pia, depois em flexões enquanto entrecruzava mentalmente os indicadores das duas mãos para cima, para baixo e para os lados tentando decifrar a frase. Alto lá e pára o baile, pensou para ele, quando finalmente se apercebeu da coisa. Afinal ele em moço tinha tido um arrebenta cus daqueles. Mas nunca ninguém lhe dissera que andar de bicicleta valia como desporto. Grande coisa andar de bicicleta, vai mas é trabalhar como diz o outro. E insistia, grande coisa andar de bicicleta, qualquer pessoa sabe – com excepção do seu vizinho gordo, que a única coisa que sabia andar era de bola debaixo do braço, a mostrar-se, tipo prostituta em saldo (queriam, isso não existe pois não?). A partir desse dia ficou a saber que afinal sempre fora um desportista, não pagava era as quotas, assim como os católicos que não vão à igreja, mas são sócios desde a 1ª comunhão. Nem pediu conselho ao colega mais experimentado, sobre que “material” deveria adquirir. Daquele novo “desporto” percebia ele.

È com o orgulho, igual àquele, de quando saía da água com o peito inchado direito á tolha na praia, que o vemos todos o domingos, quer chova ou faça vento, pôr-se á frente do grupo a marcar andamento, sabendo que enquanto conseguir subir para uma bicicleta – nem que para lá chegar tenha de ir de bengala – nunca mais vai deixar de ser desportista.

Foi nessa altura que um dos mais veteranos do grupo desatou a rir.

- Ouviste bem o que o chefe disse?

Volantino Inteiriço ainda esboçou uma última desculpa.

-  Tá bem. Em circuito fechado ainda o percebo. Mas médias de 33, isso é andar muito.

O velho chefe de fila aparentando um ar chateado, achou que a coisa já tinha ido longe de mais no seu entender, resolveu puxar dum travão pondo fim aos ataques incessantes:

- É que as minis não levam tanto.

publicado por Ubicikrista às 03:30

01 de Outubro de 2009

FICÇÃO

A Asma e a Lesma

“Quando preciso de estar sozinho vou para os transportes públicos em hora de ponta”, I

Prólogo…

Aqui estou eu sentado á espera que me venham buscar. Nem sequer estou cansado. E o que eu treinei para aqui chegar. À partida deram-me um mapa que me indica para andar 5 km em frente, na próxima rotunda vire na terceira saída á direita e ande mais 50 km pela estrada nacional não sei quantas. Sempre em frente. Não há que enganar, não fora o facto de aquele mapa não ser daquela estrada. O melhor é fazer contas à vida. Mas primeiro vai uma mijinha, como os profissionais antes de irem ao controlo. Desde pequenino que tenho uma infecção urinaria, e não desde há 2 anos como o Sérgio Paulino com a asma (bué de atletas de todas as modalidades sofrem deste mal, que se trata inalando salbutamol, salmeterol ou terbutalina), como tal preciso de um medicamento que qualquer doutor veterinário passa (a receita para um animal doente lá de casa pode ser abatido no IRS - a sogra conta, claro), chamado furandantine que me ajuda nos dias difíceis (não, não é para esses sítios onde estão a pensar) e também me ilude a ter mais força muscular e a baixar o índice de gordura.

A malta amiga chama-me o Praga Multas e lá saberão porquê. E aviso já de que não gosto de dias de sol muito quente, de vento, de estradas ruins, nem de paralelos (muito menos quando mos atiravam à cabeça em miúdo). Mas o que me irrita mais a partir de Janeiro é as lesmas que se encontram pelo caminho e que se colam às rodas, pneus e quadros, que depois de secas ficam negras. A gente pensa que é sujidade ou alcatrão da estrada. Só saem da bicicleta a martelo e escopo. E então quando chove, são às dezenas na estrada. Passo a vida a fazer gincana para não lhes acertar. Esta obsessão é tanta que me parece que os outros ciclistas estão sempre a falar nesta palavra, que para mim é palavrão (os galegos até usam o carago em vez da virgula). Mas uma coisa sei eu, quando chega alguém de fora do grupo avisam-no logo: Desvia-te das lesmas, não as pises, etc.

Aqui estou eu num destes passeios ao Algarve de 200 kms, no meio de 500 gajos. Nem sei se gosto ou não. Pelo sim pelo não, vim. A minha mulher quando me conheceu, e a convidei a passear, ficou sem saber o que fazer ou dizer. Foi a mãe que a aconselhou, que para conquistar um homem qualquer mulher precisa apenas de ter sex-appeal. Mais tarde confessou-me, que como não sabia o que era aquilo, pelo sim pelo não, lavou-se por baixo.

Hoje safei-me de um acidente (Um? Recordo-me uma vez, aqui à anos, quando a mulher me ligou a dizer para ter cuidado que havia um louco na TV a guiar em sentido contrario, na zona onde eu andava na distribuição. Um, disse-lhe eu na altura, havias de ter visto, eram ás dezenas – desconfio que o policia que me multou sem razão foi só para se exibir na televisão), mas se o tivesse tido já não teria os próximos percalços. Foi no inicio da subida da serra do Cançakostas, levantei-me do selim e baixei ligeiramente o andamento, para começar a marcar o meu ritmo que me costuma rebocar até lá a cima, nem olhei para trás, mas só ouvi trás, catrapás, ói, ui, fosga-se, cabrão de merda, etc. Pareceu-me ouvir ferro a bater com alumínio ou carbono. Devo ter feito confusão pois não vi nenhuma oficina ali por perto. Não sei ao certo o que se teria passado, pois não costumo olhar para trás nas subidas, aliás nem para a frente, para não me assustar com o que falta, pois gosto de ir no meu ritmo.

O percalço seguinte não foi bem numa subida, foi antes num plano inclinado. Mas a estrada estava tão ruim no meio que resolvi mudar de repente para a berma da direita. Voltei a ouvir as mesmas palavras duns malcriados, mas desta vez já não ouvi ruído de material a bater. Coisa estranha isto só acontecer mal se começa a subir uma chapada.

Passámos por um povoado onde estava um fogueteiro a desfazer-se, calculo, do material em excesso (tempos de crise) que ninguém lhe comprou este verão e que ele tinha reservado para umas florestas. È que aquele material vale ouro para os bombeiros, pois mal dão por um a arder no campo, avisam-se uns aos outros e correm logo a tentar apagá-lo antes que arda todo. Desconfio que fazem colecção. Deve ser como um primo meu com os selos. Diz ele que só têm valor depois de usados com o carimbo por cima. Novos não prestam. Manias de coleccionadores. Ou então deviam estar a festejar a nossa passagem. Já não devia haver ciclismo por aquelas bandas há muito tempo, daí o motivo para uma festa daquelas. Lá me disseram que o presidente da junta nem concordara, pois gostava mais de ver pernas de mulher que de ciclistas. Não sei porquê jack as nossas têm menos pelos que as de algumas mulheres. Por falar em pernas, as melhores que provei até hoje foram as de râ.

Entusiasmei-me tanto a olhar para cima, a ver as canas rebentarem, que só desviei o olhar quando ouvi o pneu a imitar o meu gato quando lhe pisam o rabo, nessa altura vi uma cerca de arame farpado debaixo da bicicleta, a metro e meio da estrada. De onde é que ela teria vindo? Parei para mudar a câmara-de-ar, mas a válvula era tão pequena e mixuruca que no aro da roda só lhe aparecia a cabecita. Ao fim de minutos a dar ar ao aro, quase ficava com uma roda daquelas lenticulares, que me daria jeito com o vento lateral. (Continua)

publicado por Ubicikrista às 23:21

Ficção


A Asma e a Lesma

 

(continuação)

Ao fim de minutos a dar ar ao aro, quase ficava com uma roda daquelas lenticulares, que me daria jeito com o vento lateral.

Quando acabei, nem ciclistas, nem carro de apoio ou vassoura, nem o raio que os parta. Mas lá fui atrás deles, até que cheguei a um sítio onde as estradas, segundo a poesia arquitectónica dos senhores engenheiros construtores, se enlaçam umas nas outras que nem uns amantes, vindas de todos os lados para confluir numa rotunda. Aqui para nós que ninguém nos ouve, as rotundas, parece uma ideia tirada daqueles filmes com uma fulana no meio, rodeada de homens nus, todos com os sinais de trânsito devidamente a confluir também para ela. Deveriam ser proibidas estas insinuações pornográficas na via pública. Onde é que estes arquitectos estavam com a cabeça? Inspirações na Internet de certeza. Aqui á 30 anos não deixavam fazer arte deste calibre na estrada. Ainda perguntei a um brasileiro daqueles que vendem férias se já passaram os ciclistas:

-Há que tempos homem. O que é que você esteve fazendo. Cagando?

Caganda lata, pensei cá para mim. E eu que sou um apreciador da simpatia brasileira. Sim, pá Tia talveiz, ainda o ouvi dizer.

Aqui estou eu 2 km mais á frente sentado num muro. O que é que eu vou fazer á minha vida? Tenho aqui uns contactos no telefone, mas de que me servem se não se conseguem ver de dia com esta claridade toda. O único numero que sei de cor é o da minha sogra, pois era para lá que a minha ex dizia que ia, sempre que saía de casa toda aperaltada – agora que nos separámos quem passa lá o tempo todo sou eu, mas só por causa dos netos. E da comida, confesso. Vou ligar a avisar, já que não sei onde estou, para não esperarem por mim para jantar.

Pois é, a minha ex agora tem um enteado novato. Ela disse-me que o estado lhe dá 200 aerios para ele não trabalhar. Ainda assim muito inferior ao que ganha o pai dele (236) de reforma por ter andado toda a vida, imaginem, a trabalhar.

O gajo quis espetar um piercing para valorizar o desemprego, mas disseram-lhe que a lei não lho permite. Mais sorte teve a irmã ao espetaram-lhe uma agulha para um aborto, mas isso já a lei autoriza.

O pai dele tentou fechar uma janela que dá para as traseiras onde 2 pombinhos (eu não disse um pombo e uma pomba) passam o dia a fazer marmelada (oxalá que não seja para a venderem em cubos) mas não deixam, porque isso é fazer obras. Mais sorte teve o tio dele, no ano passado quando foi despedido da fábrica, e lhe ficaram com a casa, juntou-se a outros nas mesmas condições e vá de construir umas barracas. Aquilo já parece um bairro, mas não há problema, não é considerado obras.

Eu também tenho um filho adolescente menor, que para não ficar a polir o sofá lá de casa ou na luta de 5x1 levava-o para me ajudar nas distribuições, mas o puto não pode andar comigo deste que apanhei uma multa, pois 2 funcionários do ministério na sei do quê, consideram isso trabalho infantil. Mais sorte teve a minha ex com o nosso puto de 6 anos. O gaiato tem mesmo jeito para contar anedotas. A mãe até já largou o emprego e acompanha-o até às 2 e 3 da manhã por essas terreolas do país ao fim de semana. Diz ela que ele gosta de adormecer encostado ao peito. Também eu gostava e mesmo assim deixou-me. Sacana do puto até nisto me ganha. O que me alegra é que ele não ganha só a mim, ganha para todos nós.

Quem também ganhou foi o que deixou de ir comigo. Ganhou uma chapada, estava a pedi-las. Agora querem-mo tirar por violência doméstica. Um colega dele lá da escola matou o pai, mas nem pode ir a tribunal, porque é menor.

Eu bem digo à mãe que tenho muitos gastos com ele, sobretudo seringas para uma doença hereditária, que o malandro apanhou não sei de quem e que na farmácia me custa 100 mil reis dos antigos (50 cêntimos). È preciso azar porque o filho da vizinha de cima, como é drogado, dão-lhe as seringas de borla lá na farmácia do bairro ali mesmo à minha frente. Também lhas dão de borla lá na prisão, quando passa lá umas temporadas, mas aí não lhe servem de nada, visto que é proibida por lei a droga nos estabelecimentos prisionais.

Aleluia, já não é preciso fazer mais contas há vida, passou agora mesmo um carro da prova que ficara para trás porque se lhe acabou a gasolina e me fez sinal para o seguir. Falei-lhe do aumento de preços, a meter conversa, satisfeito por voltar a montar na bici e seguir caminho, ao que ele me respondeu:

- Ná! Na foi do aumento. Eu meto sempre 5 euros, já dantes metia 1 conto de réis.

Parvos. Nem andei 10 minutos. Atão não é que a malta decidiu parar aos 200 km. Porque o itinerário tinha mais que o previsto e ainda faltariam 20, que o almoço em vez do combinado ia ser pataniscas devido ás inscrições de ultima hora, que as estradas por onde passáramos estavam todas esburacadas, que as descidas não eram tanto a subir como no antigo percurso, que não havia barritas, que não foram distribuídas as camisolas a dizer pratique actividade física mesmo no horário de trabalho (descarregar paletes também conta?), inscreva-se no LETANI (Liberte-se, Exercite-se, Transpire, Agora ou Nunca, Insista), que os policias de transito é que aumentaram o andamento, que no ano passado um ciclista tinha chocado com um carro dos acompanhantes que se metera no meio e a organização não obstante o seguro, nem um tusta tenha dado ao ciclista, que partira um braço, o cócxis, um artelho, que andou com alcatrão num joelho durante 3 meses, que ficou só com uma orelha dum lado e até ficou com um raio ligeiramente largo, coitada da bicicleta.

Ingratos, e até fui eu que tratei da inscrição. Parecia que estava num consultório médico a responder a tanta informação. Nem os gajos que vão a tribunal respondem tanto ao juiz. Já em novo tinha dúvidas com esta história do responder: a professora queria que eu respondesse sempre, mas a minha mãe tinha outra opinião e sempre me ensinou (perdão, me gritou):

- Cala-te, não me respondas!

Eles bem me pediram os dados do meu colega Sufrino Bombas para pôr lá na ficha de inscrição on-line, mas eu atirei-lhes umas datas do nascimento e do BI ao calhas. Depois queriam números da Segurança Social, da Caixa de Previdência e depois do Abono de Família, da coleira do cão e por aí fora. De zero a nove foi só escolher. Também com a prática que tenho de ouvir os colegas lá no trabalho à sexta-feira:

- Zéi, atira aí uns numbros pó bolhetim da malta.

… Epílogo

Vocês nem devem saber quem eu sou. Porque gosto muito de passar despercebido, nem gosto de ir lá para a frente mostrar os pneus novos, como alguns fazem. E só lá vou no final porque os meus colegas já se cansaram de se exibir, senão não ia. Então eu discretamente, ponho-me de pé, meto a roda grande e como sempre chego às paragens em promero porque gosto de me sentar no melhor sítio da sombra, não sou dos que me ando a exibir nas etapas. Só o faço porque como já vos disse, quero ser o primeiro a sentar-me e mais nada. Não tenho interesse em mais nada, aliás, só para vocês verem, quando o meu sogro me perguntou se eu queria a filha dele para casar ó quêi, eu prontamente, perdão, discretamente, disse logo:

- OK.

Estou tão viciado a mamar roda, que até a subir aproveito, pois sou tão discreto que posso andar na roda de qualquer um, quando não estão a olhar. Hoje, no inicio de uma subida, ia sendo apanhado, quando o gajo à minha frente se ergueu do selim, travei, desviei-me para o lado e raspei-me dali. Um dos que vinha atrás bateu-me com a minha roda traseira na da frente dele. O que me safou (disse ou não disse que sou discreto?) foi os outros terem-lhe acertado por detrás ao mesmo tempo que eu. È bem feito, para não andarem tão coladinhos na roda duma pessoas nas subidas.

Outra coisa que me dá gosto fazer nas subidas é quando o pessoal vai todo à rasca e eu venho lá detrás esgalhado e a ultrapassar neles pela direita. Mas deixem que vos diga, que é sempre com descrição que passo tanto um, como um montão deles. Hoje desviou-se um para o lado direito e ia-o traçando ao meio. Fartou-se de me pedir desculpa, mas no fundo pasmado de onde é que eu apareci, pois momentos antes pareceu-lhe ver que não vinha lá ninguém. Sou assim, o que é que querem: não venho lá e no momento seguinte, discretamente, já lá estou. Depois em voz alta procurando apoio popular, e mais uma vez, discretamente sublinho, recrimino:

- Vou eu a tentar recolar e este gajo atravessa-se à minha frente.

Mas mais giro mesmo é naquelas pequenas inclinações logo á partida, aos domingos, quando o pessoal ainda vai nas calmas a conversar e ainda vão aqueles principiantes do caneco lá na frente. Primeiro atiro:

- Hei pessoal, já viram tanta lesma. Olhem bem para estas lesmas. È só lesmas á minha frente. Afastem-se delas.

No inverno, então é de morte. Alguns usam um guarda-lamas na roda detrás, senão as calças ficam todas encardidas no sítio onde as costas mudam de nome. Nessas alturas não resisto em meter-me com eles. Simulo ultrapassá-los momentaneamente, enquanto aviso:

- Não podem vir na roda, senão salta laminha para trás.

publicado por Ubicikrista às 21:49

«Só os imbecis dizem a verdade. Como sou uma pessoa inteligente, minto sem parar.»

 

Hoje, às 8:00,  encontraram-se na bomba de gasolina P. Thyrohlensso, P. Phurthelly, P. Rhapohuzu, J.M. Jhuhanhu, J.M. Hahleyxu, J.A. Phahlhas, J. Thoohsey, J. Carhvahlhu, M. Mahgnhum, e M. Pehedhru. Além disso pelo caminho juntar-se-iam E. Jhakshinhto, o cunhado do Phahlhas, que de momento apelidaremos de Suhysshu, e Títulos Shéekharra. Um total de 13 barrigudos[1] 13, dispostos a sofrer uma das passeatas mais temidas por todos.

Por volta das 8:06  dá-se a saída com um aquecimento bem realizado, não sem antes se meter o Hahleyxu com burra e tudo, devido a um descuido, num buraco de mais de meio metro de profundidade perante a surpresa dos presentes. Pouco mais à frente, o Thoohsey deixa cair algo que assusta todos os barrigudos, pelo barulho que fez devía ser o alpendre da casa, e vejo que de titanio não era de certeza. Pouco depois apeia-se o Thyrohlensso da burra devido ao roçar de ferros. Esta saída começou com mais percalços que a de domingo passado.

Antes de chegar ao desvío da IP incorpora-se o Jhakshinhto. O ritmo ía subindo até alcançar os 24/25 km./h, ainda houve alturas de 27 km./h. No Cabeço da Caca alcança-se o Suhysshu . Em Almayate já não  contavam com o Shéekharra, mas este devía estar escondido atrás de alguma coisa, pois ninguém sabe de donde saiu, conseguindo surpreender os barrigudos todos pela retaguarda.

Ao tomar o desvío da circunvalação de Vélez o grupo ficou dividido em dois, ficando na ressaca Hahleyxu, Phurthelly, Thoohsey e Pehedhru. Os dois grupos levavam velocidades parecidas, pelo que não se iriam unir em todo o percurso, e para mais, os de trás, puseram-se a revesar a uma velocidade que rondou os 22 km./h com o vento de frente.

Quando passavam por alturas do desvío em Benamocarra cai, tal como a primeira fruta madura, na invernada antes da temporada, o Suhysshu, que se põe na roda e se consegue manter um bom bocado. Mais tarde, à altura de Trapiche põe-se na roda também, após ser alcançado, Jhuhanhu. Aquilo era a o grupo da vassoura inseparável. Ao chegar ao primeiro desvío para Canillas (faltavam 10 km.) estava à espera o Phahlhas, para poder voltar com o Suhysshu e o Mahgnhum e unir-se à vassoura inseparável. Sobem a primeira rampa e ali esperava-os o Rhapohuzu que também se junta. Prosseguem e um pouco e mais adiante encontram, também à espera, o Shekharra. Após a retirada do Phahlhas, Suhysshu  e Jhuhanhu, o grupo mais numeroso era a da vassoura, sendo formado pelo Mahgnhum, Rhapohuzu, Hahleyxu, Phurthelly, Thoohsey, Shekharra e Pehedhru, quer dizer, "o autocarro" com a excepção do artista convidado Shekharra que, entre vivas e aplausos, é proclamado como Rei do Autocarro.

No local do reagrupamento, ao segundo desvío para Canillas (faltavam 8 km.) estavam à espera o Jhakshinhto, Thyrohlensso e Carhvahlhu. Após dar um descanso ao corpo e a frase lapidar "Quem é que escolhe estas rotas, caraças?" começa a ascensão à velocidade livre. Os primeros a abalarem foram Jhakshinhto, Thyrohlensso e Carhvahlhu e para surpresa, dos presentese e ausentes, fica com os de detrás, o omnipotente Títulos Shekharra. Sim! Shekharra ía com a escumalha da vassoura, de PASSEIO, mas ía com eles e além disso meteu conversa, distribuiu queixas, voltou a esconder-se e voltou a atacar pela retaguarda, ou seja, deu espectáculo. Os barrigudos não caíam em si na sua admiração ao verem semelhante figura entre eles, numa subida, e a animar a malta.

O grupo formado por Hahleyxu, Phurthelly, Rhapohuzu, Shekharra e Pehedhru passaram toda a ascensão discutindo sobre se deviam ir a 7,9 ou a 8,1 km./h até à chegada. Quase ao final da ascensão, onde se podem ver os maravilhosos cenários sobre a represa de Viñuela é o lugar onde Phurthelly tenta distrair a atenção de Shekharra enquanto reduz distancia. Quase passa desapercebido, e a não ser pelo seu assoprar ofegante durante o sprint, os barrigudos não teriam podido topar-lhe a "façanha". Na entrada da povoação, após o reagrupamento, estabelece-se outro sprint. Pehedhru não acredita no que ouve e Hahleyxu desfaz-se em risos sem deixar de sprintar. Phurthelly gasta as reservas enquanto Shekharra, na cabeça, pedala tudo o que pode afirmando que os barrigudos do autocarro são traidores e perigosos.

Finalmente chegam à praça da fonte em cima das 10:10 os primeiros, e sobre as 10:30 os últimos. Hahleyxu continuava sorrindo. Já não se contava que aparecesse mais nenhum dos barrigudos quando, mesmo às 10:45, chega Mahgnhum, surpreendendo todos só pelo facto de ter chegado, após passar uma noite desenfreado na borga, mas ali estava ele, sim senhor! Com tempo suficiente para um descanso antes da descida programada para as 11:00. A velocidade media da vassoura tinha sido de 17 km./h.

Às 11:00, como estava programado, começa-se a descida que o Mahgnhum, Shekharra, Jhakshinhto, Carhvahlhu e Thyrohlensso fizeram rapidamente e Hahleyxu, Phurthelly, Rhapohuzu e Pehedhru  enfrentaram-na com mais calma. Em Trapiche reagrupam-se, encontrando-se já ali o Thoohsey que os esperava e depois de se abocanharem convenientemente, retomam a marcha voltando a formar-se dois grupos.

Lá adiante iam: Jhakshinhto, Thyrohlensso, Carhvahlhu, Shekharra, Mahgnhum e Rhapohuzu e o grupo da vassoura estava formado por Hahleyxu, Phurthelly, Thoohsey e Pehedhru. A vassoura foi fazendo relevos pelo facto de se ter que colaborar face ao vento. Quando chegam à Torre del Mar encontram o Rhapohuzu e o Mahgnhum que se voltam a juntar para formar a vassoura inseparavel só que desta vez tinham mais trabalho já que por ali soprava um vento de frente ainda mais forte. Num ritmo acessível para todos continuaram a render à vez até encontrar uma manifestação que impedia a estrada.

Razão não lhes faltava, tinha morrido uma miúda atropelada mesmo naquele lugar. Todos sabem que desde que fizeram a via de circunvalação ninguém respeita os limites de velocidade tendo-se visto veículos, inclusive camiões, a mais de 100 em troços cuja velocidade limite é 50 km./h. Quem quiser fazer corridas pode faze-lo no IP que passa paralela à N-340 a menos de 2 km. Os barrigudos pararam  respeitando o corte na estrada, mas os manifestantes indicaram-lhes, na altura, que eles podiam passar. Houve um ou outro barrigudo que pensou unir-se à manifestação mas, aos poucos, os efectivos da P.G.C. acabaram com a  mesma.

Ao chegar ao IP fizeram a habitual recuperação de pernas, chegando ao enfardanço às 12:40 os primeiros, e às 12:55 a vassoura. A velocidade media da vassoura inseparável, foi de 21 km./h e a distancia percorrida foi de 78 km. com uma montanhita de segunda categoria incluída. No enfardamento estava J.Zheéhra à espera e após termos tomado alguns "recuperantes" marcharam-se para a sua sede desportiva, satisfeitos por esta " clássica de passeio ".

Vamos ver se no domingo que vem, no regresso, se organiza outra vez a Vassoura inseparável a uma velocidade de 7 ou 8 km./h. Cobardes! Caso a vassoura continue assim organizada, ai do elite que se aventure!. De certeza que há burburinho.



[1] No original "globeros". Um puzle para resolver já que globo chamam os espanhóis ao balão, "globeros" serão os que possuem ou escondem o balão, na gíria ciclista debaixo da camisola, logo...Eureka! Barrigudos.

publicado por Ubicikrista às 16:36

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